O que acontece? Quando eu vivo algo maravilhoso, é muito difícil a passagem. Tudo passa,é verdade,porém tudo fica, também é verdade.
Algo que fica extremamente, encarna em mim como um beijo, extremo como ser muito num instante, e isso insiste em ficar. E isso me incomoda em ficar. A paixão é excesso de visão, mistura de visões, insistência em perseverar. A paixão não admite a morte. Porque tudo é vida. O sentimento extremo. Emoção. Faço das palavras remédio para minha paixão. Para que eu a respeite. Deixe-a escorregar e deixe-a se prender e se apertar ...e me apertar forte, até cansar e soltar em alívio; em resposta ao forte, manso.
O extremo sentir não é para fracos. E humanos pelo jeito não são fracos. Não é a toa que se ‘fica’ com alguém: se exerce o estar e todo agora permanece quanto tão intenso sentir. Quanto mais se sente mais se permanece. E se sente o contraste com o tempo, dessa imobilidade depois que ela passa. É como uma pedra frente a um rolo de linha a girar: linha contínua de movimento, sempre diferente do antes. E a pedra fica: e “a pedra fica” é contraditório de se repetir, pois a repetição é sempre mudança e mudança é tempo e tempo é fluir. A Pedra só fica uma vez. Seria preciso ter escrito “A Pedra Fica” , ou a imagem de uma pedra numa só única e primeira visão, num só perceber, para se chegar perto da idéia do que é o ‘Ficar’ da pedra_ e pousar nesta visão, imóvel a partir de seu nascimento, fixa. É que o nascer do fixo provoca um lapso em sua imobilidade, em seu ficar, ou em seu fica-se, e esse lapso gera uma intermitência, e toda intermitência pisca, porém fica. Como o ‘sinal’ cosmocômico, ela fica pendurado no tempo, piscando.
O incrível da paixão é que toda banalidade importa e se preenche de valor. Tudo importa, até os mais insensatos sentires, pensares, fazeres. É preciso saber jogar no infinito de si mesmo e ter a coragem de não confiar em si, e ter essa possibilidade. Sempre descobrir outro em si mesmo: e eu volto à mobilidade neste novo exercício, a mobilidade e a imobilidade de ‘ ser’, de compartilhar, do compartilhar o Amor.
Me interessa este ser Amor que fica e vai. Vai e vem imóvel. O piscar é em si um ato humorístico, é a ação do fixo. É o que faz dele um olho. E todo olho vê e é visto, ação de imagem, ação de e-moção; para dentro e para fora, espelhagem, ótica. Duas câmaras espelhadas comunicadas. Quem pisca, ou o que pisca, diz: deixa comigo, ou o que quer dizer o piscar? O piscar convida, o piscar chama, o pisca sinaliza, o piscar, de um olho só, ainda mais. Um olho só, de dois, entrega tudo: está divertido agora, está pronto, está na hora, estamos bem aqui. Eu estou aqui tão distante, mas te dou um sinal, uma pista. Piscar é a pista do improvável, do surpreendente acontecimento.
E, no entanto, a estrela pendura-se na eternidade da distância cosmológica. É tão distante que a distância em sua enormidade dobra-se sobre si mesma e cria um caminho de conexão mais curto entre seus extremos. Nesta dobra de distâncias o início de uma linha pode estar perto de seu fim ou de sua metade. A eternidade então chega perto do tempo, do que está agora passando. E a inconstância beira o fixo. Estar longe irrompe no que está perto, e já ter acontecido ou ainda acontecer chega no presente. O imóvel beija o móvel ou o contrário e ainda mais...O impossível beija o possível e ainda o único beija o múltiplo e estilhaça-se em sua significação. Tudo ao mesmo tempo e rompendo a casca das palavras como uma ave pronta no ovo, revelando seres complexos por trás dos signos, mundos num ponto.
Escrever é substancialmente contraditório, o mais contraditório que se pode dizer. É o contrário do dizer por que fixa algo que se parte e assume vida própria nos estilhaços do que se entende ao que se diz, ou que se diz ao que se pensa e sente. São pedaços fragmentados do Todo de informação que sinto que me lês, que me vês_a paixão eterniza o ficar(invasão) A paixão minimaliza o barroco sem tirar seus detalhes. Ela preenche uma in-signi-ficância.(surgir) Ela deixa que se digam besteiras também (mesmo que ela não deixe nem negue nada; na verdade ela se permite) que se seja ridículo muito ainda. Assim, o ridículo é uma característica amável ao extremo; o ridículo, aquele ridículo inconsciente.
E a paixão perdeu o medo. Até se pergunta: ”_ Ops...onde foi que o deixei? Em que bolso o esqueci mesmo? Não lembro quando passei a mão sobre ele e não estava mais ali, e não soube de sua existência."
E é assim que acontece sabe. A paixão toma conta sem movimento. É um ato extremamente sacana. E humorístico. Por isso talvez eu tenha tanta dificuldade; é que acho que tenho levado a paixão muito a sério. Agora eu percebo que ela ri o tempo todo, a danada. Fica piscando me olhando, pulsando em meu coração, fazendo jogos de palavras e distorcendo sensações,
e muda, sem palavras.
Eu estou esperando na sua fixidez ela mexer um pouquinho e se entregar, e se denunciar ‘sem querer’! Para eu flagrá-la e dizer pra quem estiver a ouvir: “_viu? Mexeu!
A paixão está passando com sua carruagem carregada sensação leve, peguei o bonde e estou dentro dela. Estou vendo onde ela me leva...
Para o João.
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