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G(ênero-so(´ gênero junto

Pensando nas diferenças repetidas como igualdades diferentes na continuação(?!), postei este texto neste dia da mulher, e quis problematizar, segue após....
"Agradeço à toda sincera e-moção de dizer à mulher coisas boas.....mas vamos ser sinceros.....mulheres e homens não são iguais....e querer conquistar a igualdade neste sentido foi um dos fracassos do feminismo.....não somos e não podemos querer ser iguais...e somos sim...mais frágeis...........porque o homem tem, quer queira quer não, outras qualidades que não nos pertencem. E sim temos, qualidades que não pertencem aos homens; querer dizer diferente é forçar a natureza.....meu desejo é que homens e mulheres se respeitem um dia sim de igual pra igual... e que o machismo e feminismo sejam mera lembrança de uma ignorância da infância humana e que, reconhecendo que são sim...muito diferentes....com toda semelhança enquanto SER....quanto aos próprios singulares particualres de gênero e indo além destes em direção à franca humanidade .....não apenas digam, mas internamente vivam.....a realização de uma comunhão participativa das diferenças.....amo os homens e as mulheres....feliz dia do feminino dentro da humanidade!"



É sempre perigoso afirmar essa diferença....pois ela era e ainda é...uma justificativa usada para desqualificar as mulheres para outras atividades que não as "feitas" por natureza,  existentes nelas:, como procriar; e junto à isso cozinhar costurar limpar arrumar lavar, estereótipos socializados como femininos, ainda existentes para a grande maioria da massa feminina popular, e que seriam os responsáveis pelo "desinteresse" da mulher em ser ativa na sociedade. Motivo esdrúxulo também pelo qual a mulher não ocuparia número expressivo nos cargos de liderança e postos altos da hierarquia social. Eu como mulher nunca me identifiquei muito com o movimento feminista, pois captei sempre um ranço excessivo que desemboca  numa exacerbação dos gêneros, ao invés de uma re-união mais complexa e reflexiva dos mesmos. Mas no dia símbolo da mulher, por que não nos informarmos um pouco melhor sobre o que foi esse movimento¿ Eu preciso postar este texto sobre o feminismo e o que ele pareceu realmente desencadear: a ligação entre o feminino da sociedade em que vivemos, a educação e os padrões sociais familiares. Segue o texto que é um trecho de um capítulo e Rosiska Darcy, intitulado Quem educa a sociedade¿,do livro "Vivendo e aprendendo"( Freire, Rosiska e Miguel, Oliveira, Ceccon) e um outro meu reflexivo por cima.

                        "A erradicação das discriminações de que as mulheres são vítimas na sociedade é um problema essencialmente político. O movimento feminista é o movimento que revelou essa evidência.
De um lado, ele procedeu à demonstração do ridículo e do anacronismo dos argumentos que, falando de diferença entre homens e mulheres, conotavam nessa diferença uma hierarquia que inferiorizava a mulher. Por outro lado, ele assumiu essa diferença e transformou-a em bandeira de uma revolução social.
            O movimento feminista nasce de uma crise de identidade que atingiu, antes de tudo, as mulheres, da classe média, na maioria intelectuais, estas que poderíamos chamar de"assimiladas." Foram essas mulheres que, assumindo um estilo de vida masculino, participando, aparentemente em pé de igualdade com os homens, do mundo deles, foram elas que, primeiro se deram conta da impostura que viviam.
            A sociedade industrial empurra as mulheres na direção do mundo do trabalho remunerado e pede delas uma força de trabalho pelo menos igual à dos homens. Como trabalhadoras, elas não têm direito a reivindicar a sua diferença. Mas essa mesma sociedade que as universalizada como trabalhadoras, as particulariza como mulheres. Elas não podem ser diferentes, mas elas são, de toda maneira e a priori, vistas como diferentes. 
            O mito da igualdade pelo trabalho se esboroa. Entre a universalização e a particularização do seu ser, elas são condenadas à esquizofrenia social. Elas se tornam seres divididos, vivem um conflito permanente, daí a dificuldade de encontrar uma personalidade própria. Como é possível representar, no mundo do trabalho, um papel que faz abstração do seu sexo e,  ao mesmo tempo, um papel que se apóia exclusivamente no seu sexo¿
            Nesta crise de identidade está contida uma questão que o movimento feminista vai responder. Se as razões que separavam o mundo das mulheres do mundo dos homens estão desaparecendo nas sociedades industriais avançadas, por que as relações de poder entre homens e mulheres não mudam¿
            Nesse ponto torna-se evidente que a manutenção de uma ideologia anacrônica se dá porque há interesses  investidos nessa sobrevivência e esses interesses não são diferentes, no caso dos homens e mulheres, daqueles que mediatizam outras relações  de dominação. Não há, portanto, que esperar dos homens a iniciativa de transformação de uma situação social da qual, consciente ou inconscientemente, eles se beneficiam. Daí a necessidade de um movimento feminista autônomo que seja, ao mesmo tempo, um instrumento de luta e um contexto educativo.

            E é isso exatamente que ele tem sido. A luta das mulheres foi e é, na sua prática social global, um intenso terreno educativo que, no plano individual, permitiu um processo de autoformação e, no plano cultural, a emergência de uma cultura, quebrando assim o silêncio sobre o universo feminino.
            Como todo movimento de libertação, o movimento das mulheres foi, ao mesmo tempo, um fato cultural e um fator de cultura.
          Fato cultural na medida em que ele é o resultado do encontro das mulheres que chamei de assimiladas, com as outras. Assimiladas são aquelas que compreendem que a tentativa de integração em pé de igualdade no mundo dos homens era pura perda, que compreenderam que viviam  no mundo dos homens como exiladas. As outras são aquekas que foram guardadas em casa, condenadas à imanência do quotidiano, destinadas a centrar o mundo nelas mesmas, nos limites de seus corpos. Seus corpos, sua única aventura, seu centro vital.
            O encontro dessas mulheres num só movimento faz com que ele seja, antes de tudo, um fato cultural. Ele é também um fator de cultura na medida em que esse movimento evolui de uma reivindicação de integração e de igualdade num mundo masculino para se transformar numa oposição portadora de uma reivindicação de transformações globais que começam na família e que, na medida em que progride, muda a cultura, e é nesse sentido que dizemos que o movimento é um fator de cultura.
            Essa análise do impacto cultural que a luta das mulheres opera na sociedade é importante na medida em que uma boa parte do pensamento bem  intencionado se limita a oferecer soluções educativas que favoreçam uma integração das mulheres em pé de igualdade na sociedade tal como ela é, masculina.

DARCY, Rosiska em Vivendo e Aprendendo, Brasiliense, S.p.1993-1999.p 64 a 66.


            Sim....necessitamos de sensibilidade e delicadeza, mas a realidade é que as mulheres fazem o trabalho mais penoso, duro e perigoso e menos remunerado( Evelyne Sullerot APUD Darcy)
            Ainda vejo bem presente o problema do papel do"feminino" gerador, da gestação e educação das crianças num mundo que não considera estas atividades como ações sociais de valor, mas meramente como um evento automático, desconsiderado-as totalmente como trabalho. E a idéia de gerar um filho nos implica, querendo ou não, uma pausa ou diminuição de atividades extras à criação dos filhos. A mulher e o homem, quando pais, quando assumem a criação de um ser, não realizam este trabalho de formar um indivíduo nem conseguem mater um nível profissional, não à custa de um esforço fenomenal. E na grande maioria dos casos a mulher assume essa criação quase por inteiro, e junto o estereótipo de que "é a mãe que cria. E são anos....tidos como perdidos. O resultado que vemos é a grande massa aderindo à trabalhos inferiorizados em posições subalternas ou abusivas de trabalho, em atividades que estão aquém de suas capacidades ou, no caso da classe média-média-alta no Brasil, como é o meu, a escolha por não ter filhos tão cedo, e correr o risco de perder um período de fertilidade saudável, ou mesmo, não ter filhos, para poder desenvolver-se e ser independente. (desenvolver-se é o que¿). No outro caso, pior ainda, não se poderia dizer que fez uma escolha consciente, a mãe pobre que teve os primeiros filhos aos 16 e não conseguiu se formar ou concluir segundo grau, uma faculdade e menos ainda, trabalhar numa atividade bem remunerada, de seu interesse e competência. Gerar e formar um ser, até que a sociedade se interesse por ele, não é considerado trabalho. Ser mãe (e pai) é uma coisa extremamente ativa, mas os silêncio em torno deste investimento é cruel e se faz presente na desatualização e desqualificação da'o profissinal. Claro que com dinheiro as coisas ficam mais fáceis, mas para a grande maioria, é cruel. 
          É preciso desautomatizar estas "escolhas", nos tornarmos conscientes do condicionamento destas, como experiências individual e coletiva. O preconceito de gênero ainda está muito presente na nossa vida. Está implícito na mulher mais bem informada, mais esclarecida. É como o racismo, no Brasil, ele é oculto e velado. A prova cabal da desvalorização do trabalho de formação do "Ser' proporcionado pelos pais (e pelo país), na sociedade atual, é a educação escolar pública. Educar não nos é entronizado como uma função nobre, muito menos como sendo a principal função da sociedade (ora pois todos tivemos uma mãe e ou pai , seja quem foi que nos cuidou, o avô, a tia ou a empregada. Nós as tivemos, se fomos sortudos, nós artistas, filósofos, cientistas, políticos, pedreiros, padeiros, por no mínimosb uns 15 anos). O estereótipo feminino desvalorizado recai sobre o magistério, sobre o sistema escolar, na medida em que constatamos a evidência de que entregamos esta profissão na sua grande parte à quem? Claro...às professoras, às mulheres, menos remuneradas, e isto tem tudo à ver com o estigma que tento problematizar, com a ajuda do livro citado.

            "Esperar que estas professoras mudem de atitude implica investir na sua formação, introduzir a discussão do problema feminino (e, em conseqüência, do masculino), nos estágios de formação."
            Ou seja, educar as professoras e professores, educar as mães e pais. Não podemos considerar que as mulheres assumiram uma posição igualitária, isto não ocorreu ainda, nem estatisticamente, nem culturalmente, em nós. O feminismo abriu caminhos aos tropeços e estamos recém provando seus frutos e a emancipação da mulher. Fazem apenas uns 60 anos, e no ocidente somente. Isto contra centenas de anos de desvantagem em experiência de vida ativa pública masculina, cem relação aos 60 anos da feminina.

            "A ocultação da vida privada, ou da maneira feminina de existir, na planificação social, na determinação do perfil das instituições sociais, é um ato de força, de imposição do estereótipo masculino. (...) Essa maneira feminina de existir *(ou seja, de ser mãe, cuidar, educar, trabalhar para outro ser viver) não é levada em conta pelos administradores da sociedade, que entendem que igualdade de oportunidade para as mulheres quer dizer se adaptar à maneira masculina de existir. O sistema educacional, o mercado de trabalho, onde a maioria dos postos bem remunerados é a tempo integral, as instituições sociais, tudo concebido em termos de vida pública, em oposição à vida privada, apoiando-se numa premissa implícita de que alguém se ocupa da vida privada.(...) "
            Quer dizer, quando a mulher só tem direito à quatro ou no máximo seis meses de licença maternidade ela é posta numa condição de luta entre desenvolver o que sente como saudável e natural, ou seja, ficar e cuidar do seus filhos integralmente, ou lutar na difícil tarefa de ter um neném recém nascido e ter de despender seu tempo no trabalho com outra atividade, enquanto seu filho fica com outra mulher, que deixou seus filhos por sua vez, em outro lugar....e é esta a  mais sobrecarregada mulher....

            Nas diferenças...ou desigualdades, nem deveria eu querer carregar o mesmo peso que um homem da mesma altura, mas 30% mais forte, nem a sociedade nos coloca em condições iguais. Então realmente não há igualdade! De certa forma temos que identificar onde precisamos manter as diferenças, para não nos brutalizar, querendo ser iguais onde não somos, e de outra precisamos conquistar igualdades que a cultura nos impõem como diferenças intrínsecas biológicas, mas que são reflexo de uma cultura da desvalorização do que é feminino, do que cuida, gera, forma, educa. 
            Me pergunto onde me encontro eu...que faço parte de uma geração de mulheres que "escolheu" privilegiar a vida profissional e não ter filhos muito nova, ou simplesmente me aconteceu assim...Ou será outro movimento ainda não esboçado de socialização da mulher, das filhas de uma geração mais liberal e informada de pais (meus pais) que tiveram seus filhos no auge da explosão da transformação dos papéis sociais de gênero, dos movimentos estudantis, da maio de 68, das revoluções de costumes dos anos 60 e 70? Uma coisa eu sei, ou melhor, eu não sei exatamente o que estas minhas escolhas irão representar pra mim daqui à 10, 15 anos....



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